domingo, 3 de junho de 2012

Bundas: uma ironia, uma verdade

Por Mairiz Silva e Bernardo Carvalho

Em junho de 1999, Ziraldo e alguns amigos que fundaram o famoso Pasquim se unem em torno de um novo projeto, a revista Bundas. Ziraldo, na época do lançamento da revista, dizia que Bundas estava surgindo para dizer que o país precisa dar mais valor a cabeça do que às nádegas, daí o nome irônico.

Ziraldo afirmava que o povo estava esvaziado pelo consumismo, pelo imediatismo e que ninguém queria mais criar ou escolher o próprio caminho, mas sim comprar tudo pronto. Este seria o principal motivo pelo qual Bundas nascia: para ser alternativo ao que estava sendo "jogado" pela mídia para seus receptores, mas com a proposta de fazer isso com humor. Tinha por objetivo fazer nascer um veículo sem vínculos, ou seja, uma imprensa não comprometida. Um de seus slogans era: "Quem mostrou a bunda em Caras jamais vai mostrar a cara em Bundas".

Bundas era semanal, e a principal maneira de expor suas idéias era através do humor. Os editoriais eram escritos por Luís Fernando Veríssimo e traziam assuntos ligados a escândalos e corrupção no Brasil. A revista era dividida em artigos, colunas, seções fixas e cartuns. Os articulistas e colunistas também colaboravam nas seções fixas com comentários. A revista contava com várias seções, entre elas Bundalelê; Bundão da Semana; Covil do Jaguar, onde o próprio Jaguar escrevia comentários; Pixels, com frases e trechos humorísticos; Salão de Anedotas: Piadas; A Bunda da Semana; Bunda Lê Livros, entre outras. O leitor tinha espaço na revista, na seção Cara Bundas, onde a revista publicava as cartas e e-mails. A revista trazia a seção Bundas Entrevista, onde Ziraldo e alguns colaboradores da revista faziam uma mesa redonda com uma personalidade. Todos os artigos, colunas, cartuns e comentários eram assinados por seus colaboradores.

Seus cartuns traziam, como toda revista, temas da época. Caricaturas eram feitas para gozar da situação em que determinado fato se apresentava. As edições tinham mais cartuns do que fotos. As poucas fotos que a revista trazia eram cedidas por agência de notícias nacionais (O Globo e JB). Bundas não informava o fato, mas o comentava. Outro slogan da revista retrata bem essa posição: "Aconteceu, Bundas comentou!"

Bundas quase não tinha anunciantes. A revista durou pouco mais de 70 edições e foi veiculada por cerca de um ano e meio, até que a Editora Pererê Ltda., que a publicava, se afundou em dívidas. Em uma entrevista ao portal Papel Jornal em março de 2003, Ziraldo comenta o fim da revista e fala sobre o nome tão polêmico, que foi um ponto crucial para o seu fim, além da falta de anunciantes:
─ Não tinha dinheiro para poder continuar a publicar. Eu estava na esperança de que as agências se acostumassem com o nome, e fui deixando rolar uma dívida, pensando "daqui a pouco eu pego quatro ou cinco anúncios e equilibro isso". E quando fui falar com o meu contador, ele disse "estamos devendo tanto", e eu disse "ih, meu Deus, não tem como pagar isso!". E ele falou "não tem como pagar mesmo". E eu falei "mas eu não posso, se eu parar como é que vai ser? Eu vou ser preso?" Mas não tinha como e eu parei. Parei porque o nome (Bundas) não foi assimilado pelo mercado publicitário. Eu achava que o público assimilaria o nome Bundas em pouco tempo, como assimilou o Casseta, que é um nome insuportável, muito mais grosseiro que Bundas (...) No meio revista, não dá para popularizar um nome difícil, impor uma aceitação igual à televisão (...) Bundas não foi assimilada, não conseguiu sobreviver. Em um ano e meio de Bundas eu não consegui nenhum anúncio pago. Nenhum! Eu liguei para a agência Reuters para comprar uma foto e a moça perguntou "pra que revista é?". Eu falei "é pra Bundas". E ela me disse "não trabalhamos com publicações desse tipo". Então eu falei "publicações desse tipo é a puta-que-o-pariu. A senhora vá ler a revista para saber o que está falando. A senhora é uma agência de fotografia. Que tipo de revista a senhora acha que somos?". Ela só respondeu "não trabalhamos com publicações desse tipo, meu senhor" e desligou o telefone na minha cara. (...) Eu fiquei devendo dinheiro, mas acreditava numa publicação como Bundas. O diabo é que quando eu falava mal do FHC, com o nome de Bundas, ou de qualquer outra pessoa, e diziam pra ele "olha a revista Bundas ta falando mal de você", o cara dizia "eu tô cagando pra uma revista com esse nome".

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